Quaderns de Psicologia | 2025, Vol. 27, Nro. 2, e2163 | ISSN: 0211-3481 |

https://doi.org/10.5565/rev/qpsicologia.2163

A tirania da excitação: adicção sexual e masoquismo mortífero

The Tyranny of Excitement: Sexual Addiction and Deadly Masochism

Ney Klier
Monah Winograd

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Resumo

No panorama da vida sexual contemporânea, a procura por lubricidade, substâncias estimulantes e perpetuação de experiências hedonistas, em numerosos casos, não fica limitada ao âmbito de um simples exercício do prazer. Frequentemente resulta em uma sexualidade desenfreada e compulsiva. Este artigo, dedicado ao estudo psicanalítico da adicção sexual, tem por objetivo examinar os aspectos paradoxais de preservação e destruição implicados na ocorrência desse quadro psicopatológico. A partir do exame metapsicológico dos conceitos de masoquismo de vida e masoquismo de morte (Rosenberg) e da apresentação de três vinhetas clínicas, um duplo problema é avaliado: se, por um ângulo, a adicção sexual pode ser compreendida como uma estratégia defensiva diante de situações psíquicas adversas, por outro, a aderência cega aos próprios impulsos conduziria o sex-addict a uma experiência masoquista de caráter mortífero, articulada a um prolongamento mórbido da estimulação sexual.

Palavras-chave: Adicção sexual; Masoquismo mortífero; Excitação; Psicanálise

Abstract

In the panorama of contemporary sexual life, the search for lubricity, stimulating substances, and perpetuation of hedonistic experiences, in many cases, is not limited to the scope of a simple exercise of pleasure. It often results in rampant and compulsive sexuality. The aim of this article, dedicated to the psychoanalytic study of sexual addiction, is to examine the paradoxical aspects of preservation and destruction implicated in the occurrence of this psychopathological condition. From the metapsychological examination of the concepts of life-preserving masochism and deadly masochism (B. Rosenberg) and the presentation of three clinical vignettes, a double problem is evaluated: if, from one perspective, sexual addiction can be understood as a defensive strategy in the face of adverse psychic situations, on the other hand, blind adherence to one’s impulses would lead the sex-addict to a masochistic experience of a lethal nature, articulated to a morbid prolongation of sexual stimulation.

Keywords: Sexual addiction; Deadly masochism; Excitement; Psychoanalysis

Introdução

No editorial do periódico Psychotropes, em edição dedicada exclusivamente ao tema da adicção sexual, Irène Codina e Michel Hautefeuille (2016) observam a crescente quantidade1 de homens e mulheres na França procurando por serviços de saúde com a seguinte queixa: sentem-se coagidos por uma sexualidade excessiva, descomedida. A rápida extensão das redes virtuais, suas evoluções incessantes, bem como o acesso impositivo a conteúdos de cunho erótico estariam contribuindo, segundo os autores, para a suscetibilidade de uma parte da população a condutas sexualmente tumultuadas. “Essa mudança contemporânea, tanto quantitativa quanto qualitativa, revela-se, de fato, como uma tendência bem mais ampla, não apenas cultural, mas, também, econômica, política, culminando em nosso universo ultra-liberal que insiste em promover a pornografia em todos os seus estados” (Codina e Hautefeuille, 2016, p. 6; tradução nossa). A procura por lubricidade, substâncias estimulantes e perpetuação de experiências hedonistas, em numerosos casos, não estaria limitada ao âmbito de um simples exercício do prazer.

Nesse cenário emerge a problemática da adicção sexual — quadro psicopatológico no qual o apelo à atividade sexual, de formas distintas e singulares, torna-se uma exigência imperativa para o sujeito, da qual ele não consegue se abster. A literatura médica e psicanalítica sobre o assunto endossa tal ponto de vista, paralelo à observação clínica dos aspectos limítrofes da sexualidade compulsiva (André, 2022; Estellon, 2002, 2014, 2020; Goodman, 1990, 1992; McDougall, 1995/1997). Na superfície, o sexo na condição de adicção “aparece como um demônio promissor, jurando erradicar o sofrimento, anestesiar a angústia e proporcionar o gozo pleno que a vida se recusa a oferecer” (Robert, 2022, p. 55; tradução nossa). Absorvido por uma rotina permeada de longas imersões nos domínios de uma Jouissance mortífera, o sex-addict sente-se incapaz de conter suas atuações. Ideações suicidas e depressão melancólica quase sempre constituem o outro lado da moeda, a antítese do paraíso artificial da adicção. Sentimentos mórbidos de desespero, fracasso e vergonha são recorrentes em homens e mulheres que sofrem dessa condição (Estellon, 2002, 2005, 2014, 2020; Goodman, 1992; Reed e Blaine, 1988; Robert, 2022).

Neste artigo, mediante uma abordagem teórico-clínica2, partiremos da hipótese de que haveria uma dimensão masoquista implicada na ocorrência desses fenômenos. O masoquismo, sob o viés do saber psicanalítico, pode ser compreendido como uma tendência à obtenção de prazer na experiência da dor, que se manifesta por meio de variados comportamentos, fantasias, ideações e sentimentos (Freud, 1924/2007; Glucksman, 2015; Maleson, 1984). Nesses casos, prejuízos diversos para o ego e a vida em geral apresentam-se intimamente articulados a uma nebulosa satisfação libidinal. Catherine Chabert (2006) destaca que o masoquismo atuaria como força-motriz de numerosas patologias caracterizadas pelo excesso, sobretudo aquelas implicadas nos casos-limite, panorama no qual a adicção é emblemática. Neles, o masoquismo ensejaria componentes contraditórios de preservação e destruição da vida psíquica. No que tange a essa dupla função, as contribuições de Benno Rosenberg (1991/2003) oferecem ferramentas de particular relevância. O autor propõe uma diferenciação entre masoquismo guardião da vida e masoquismo mortífero, essencial à nossa linha de argumentação.

Examinaremos, de acordo com a perspectiva apresentada, o seguinte problema teórico-clínico: se, por um ângulo, a adicção sexual se imporia como uma estratégia defensiva, medida de sobrevivência diante de situações psíquicas adversas, por outro, a aderência cega aos próprios impulsos conduziria o sex-addict a uma experiência masoquista de caráter mortífero, articulada a um prolongamento mórbido da estimulação sexual.

Masoquismo e adicção sexual

Se inicialmente o masoquismo foi tematizado no espectro da sexualidade infantil, perversa polimorfa, como o prazer derivado de uma posição de passividade perante a dor infligida por um objeto sexual, posteriormente, passa a estar também referido a modos de existência que perpassam o campo estrito da perversão masoquista, nos quais a obtenção de prazer estaria subordinada a alguma circunstância adversa e dolorosa, reiteradamente autodestrutiva (Freud, 1905/1996, 1924/2007).

Chabert (2006) destaca que, entre as noções teórico-clínicas essenciais presentes na obra freudiana, o masoquismo ocupa lugar central em diversos aspectos. Faria parte especialmente do segundo paradigma que orquestra a reflexão psicanalítica, atrelado às considerações mais pessimistas de Sigmund Freud acerca do funcionamento psíquico e da condição humana. A despeito de seus estreitos laços com o horizonte inicial ligado à etiologia sexual da psicopatologia, o masoquismo se articula sobretudo às noções posteriores de pulsão de morte, compulsão à repetição e reação terapêutica negativa (Freud, 1920/2006, 1924/2007). O sentimento de culpa inconsciente, a necessidade de punição, a resistência à mudança (ao processo analítico, à cura da doença), bem como o fracasso diante das perspectivas de sucesso, entre outros fatores que reincidem obstinadamente e operam contra o próprio ego do sujeito, seriam explicados, em maior ou menor grau, pela questão enigmática de um prazer irrenunciável, de caráter masoquista, intrínseco a esses eventos psíquicos.

No tocante a esse enigma, Franklin G. Maleson (1984) adverte que a descrição teórica e a compreensão clínica de masoquismo estão entrelaçadas com construções metapsicológicas variáveis. Haveria pouca precisão em seu uso atual, já que o termo adquiriu um conjunto confuso de significados e conotações extraídas de variados níveis de abstração, bem como de épocas diferentes do pensamento psicanalítico. A natureza da sexualidade nos diversos fenômenos submetidos à tutela do masoquismo abrange distinções qualitativas e quantitativas que, por sua vez, devem ser consideradas em qualquer exame aprofundado da questão. Quando há referência ao masoquismo, frequentemente não fica claro se seria a sua acepção ampla ou restrita que está sendo empregada. Essa ambiguidade impediria uma comunicação inteligível e levaria ao delineamento de inferências clínicas inapropriadas quanto à natureza dos processos subjacentes aos fenômenos designados pelo termo.

No que concerne à adicção sexual especificamente, pode-se dizer que a definição ampla de masoquismo seria a mais acertada, já que o quadro não se confunde com a montagem perversa masoquista stricto-sensu da vida sexual. Não se trata de um padecimento advindo do objeto sexual, de um roteiro que envolva submissão a um outro propriamente dito (ser humilhado, amarrado, violentado ou chicoteado pelo parceiro, etc.), mas, sim, de uma servidão involuntária e asfixiante aos próprios imperativos da pulsão. Por meio do apelo à atividade sexual, o sex-addict aproxima-se regularmente da autodestruição, da auto-obliteração. O resguardo de sua integridade física e psíquica é repetidamente colocado à prova.

Quanto a essa periculosidade auto infligida, Vincent Estellon (2015) afirma que a cronificação do quadro leva o sujeito a não conseguir mais satisfazer-se com as práticas e vivências habituais, conduzindo-o à busca de sensações mais aguçadas, intensas e cortantes. Logo,

O medo, a atração pelo desconhecido, a excitação mórbida, o desejo de descoberta e de exploração, a aspiração mortífera, são estados (…) que procedem de movimento transgressivo, suscetíveis de colocar o sex-addict em situações extremas de sua vida cotidiana. (Estellon, 2012, p. 109, tradução nossa)

Neste registro do “extremo”, o sex-addict é capaz de se desfazer totalmente do uso do preservativo; expor-se deliberadamente a doenças sexualmente transmissíveis; embarcar em práticas sexuais mais arriscadas (algumas sendo suscetíveis de provocar lesões corporais); abordar/assediar pessoas sem consentimento; não medir esforços (físicos, psíquicos) no ciclo obstinado da adicção; arruinar sua carreira profissional e reservas financeiras; danificar relações sociais, familiares e conjugais; embarcar no consumo indulgente de drogas lícitas e ilícitas, etc. Seja qual for a circunstância, o sex-addict vê-se impelido e estranhamente seduzido pelo embate com o perigo. A excitação sexual mescla-se com a iminente destruição de si próprio. Essa inclinação auto-obliterante, tóxica, termina por se tornar progressiva fonte de sofrimento, isolamento e marginalização (Estellon, 2014, 2020; Robert, 2022).

Em termos metapsicológicos, podemos dizer que, no sex-addict, a inclinação masoquista apresentar-se-ia mediante três caminhos principais, concomitantes e complementares entre si: (1) adesão cega a situações-limite na sua vida cotidiana, sistematicamente auto danosas; (2) sentimentos ferrenhos de vazio, auto retaliação e inferioridade após os episódios compulsivos; e, (3) regressão sensorial a uma esfera rudimentar da psicossexualidade, potencialmente mórbida e intoxicante, ligada à experiência de dilatação da excitação. No presente estudo, nos deteremos principalmente sobre esse último ponto, a ser apresentado e ilustrado nas vinhetas clínicas3 a seguir. Os três relatos são baseados em pacientes do sexo masculino4.

Vinhetas clínicas

Raphael, 36 anos, um estudante sem foco, aspirações ou metas profissionais, cuja família arca com os seus custos financeiros, estende indefinidamente o tempo de masturbação, por horas a fio. Afirma sofrer circunstancialmente de anorgasmia, uma disfunção em que o orgasmo não é alcançado após a elevação da excitação sexual. Em uma fase aguda de depressão melancólica, trancou-se solitariamente em um motel por um período de dez dias, masturbando-se diariamente por horas consecutivas, acompanhado de imagens eróticas em seu notebook e substâncias químicas como nicotina e Skunk. Fato paradigmático de um ritual que se repete em fases de estresse, melancolia e dificuldades psíquicas. Além disso, Raphael relata que suas práticas sexuais com namoradas e eventuais parceiras podem ser demasiadamente longas. Algumas das mulheres com quem se relacionou afirmaram terem ficado ligeiramente lesionadas após o extenso coito vaginal, a despeito do uso de lubrificantes. Esse modo de operar, baseado em excessos, de acordo com sua narrativa, contribuiu para o engendramento de discórdias, brigas conjugais e relações conturbadas. O rapaz diz sentir-se solitário, isolado, com graves dificuldades em se manter íntegro e saudável psiquicamente.

Jorge, 57 anos, um senhor atualmente em abstinência, apresenta uma longa história de buscas diárias por situações de assédio sexual e exibicionismo em coletivos, metrôs e espaços públicos da cidade. De forma lúcida, Jorge afirma que, em seu histórico compulsivo, não importava a descarga, mas, sim, a excitação (sic). A adrenalina, o frenesi, a exaltação em abordar diferentes mulheres e surpreendê-las com avanços sexuais, toques impróprios, roçadas, zíperes abertos, ereções, exibições do próprio órgão genital absorviam a maior parte dos seus dias. A ejaculação, para ele, não fazia parte do jogo, o orgasmo podendo ser indefinidamente adiado por dias, semanas e até meses. A estimulação sexual constante era o objetivo, a meta e o sentido de sua existência. Jorge relata ter sido quase linchado algumas vezes, quando descoberto e denunciado em suas tentativas de assédio. No que concerne à sua história familiar, diz ter sofrido passivamente a vida inteira severos abusos morais de seu pai, já bastante idoso, com quem ainda reside.

David, 40 anos, também em abstinência, reconta que, durante muitos anos, não conseguia parar de perambular por banheiros públicos e pontos de encontro homoeróticos em busca de contatos sexuais instantâneos e efêmeros. Ele não fazia ideia de que sofria de uma compulsão. A prática do cruising5 permeava o seu cotidiano, suas idas à faculdade, suas jornadas de trabalho e, inclusive, seus momentos de lazer com a família e o companheiro com quem construiu uma duradoura relação conjugal. Em qualquer brecha que encontrava, partia para o seguinte ritual: estabelecia contato visual com algum homem anônimo, insinuava interesse e esperava por um retorno. Masturbações mútuas, toques nos órgãos genitais, sexo oral, práticas exibicionistas e, eventualmente, sexo penetrativo com diversos “corpos sem rosto” aconteciam em mictórios, cabines de banheiro, sanitários imundos, espaços públicos abandonados. Não importava a idade, a estética e o semblante dos parceiros. A vigilância e a adrenalina eram constantes. O adiamento do orgasmo também. David relata que utilizava diferentes técnicas para atrasar a ejaculação, como pressionar o períneo durante os contatos sexuais. À medida que qualquer pessoa se aproximasse, a prática efêmera e transitória era abruptamente interrompida. Pouco tempo depois, a “caça” logo recomeçava. David passava horas diárias em função dessas buscas, transitando de sanitário em sanitário, colocando-se em risco frequentemente. O orgasmo e a ejaculação, segundo seus relatos, eram secundários à imperiosidade da busca por mais excitação.

As três descrições clínicas acima delineiam explicitamente a experiência de dilatação da excitação, a partir de uma busca deliberada que, a nosso ver, se relacionaria ao conceito de masoquismo mortífero, proposto por Benno Rosenberg (1991/2003) em sua ilustre obra “Masoquismo Mortífero e Masoquismo Guardião da Vida” (Masochisme mortifère et masochisme gardien de la vie). Notadamente, as contribuições de Rosenberg oferecem elementos pertinentes e ainda pouco explorados no arcabouço psicanalítico para os estudos das patologias limítrofes, especialmente os fenômenos adictivos. Nossa investigação, por conseguinte, visa destrinchar a hipótese de que a busca pela incessante estimulação seria uma dimensão recorrente e habitual nos casos de adicção sexual, a despeito de eventuais descargas brutais.

Autodestruição e o enigma da satisfação libidinal

A conceituação da pulsão de morte na teoria freudiana parte do questionamento sobre a predominância do princípio de prazer no curso da vida psíquica — que, em sua base, teria uma tendência para a obtenção de prazer e evitação do desprazer. Por meio da repetição penosa em determinadas brincadeiras infantis, no curso de tratamentos psicanalíticos e nos sonhos das neuroses traumáticas, Freud (1920/2006) avalia diferentes campos nos quais a repetição de experiências desprazerosas estaria em maior ou menor proximidade com o princípio de prazer.

No campo das neuroses traumáticas, por exemplo, manifestações nas quais o funcionamento psíquico teria sofrido intensa trepidação, os sujeitos reviveriam em seus sonhos o evento traumático. Essa reprodução do acontecimento terrível jamais poderia se enquadrar no propósito único da realização de desejo, expressão suprema do princípio de prazer, atribuído aos sonhos até então. Estes operariam antes a favor de uma captura e fixação psíquica das impressões traumáticas, obedecendo ao processo de compulsão à repetição, sinalizando uma tendência “mais arcaica, mais elementar e mais pulsional do que o princípio de prazer, o qual ela suplanta” (Freud, 1920/2006, p. 148). A relação desses fenômenos com a vida pulsional enseja o tournant que vem a modificar o rumo do pensamento de Freud.

Em 1920, a pulsão é caracterizada como “força impelente interna ao organismo vivo que visa a restabelecer um estado anterior que o ser vivo precisou abandonar devido a influência de forças perturbadoras externas” (Freud, 1920/2006, p. 160). Trata-se de uma força historicamente adquirida, que atua sobre a matéria viva e que se distingue em duas espécies: a pulsão de morte, que visaria ao retorno a esse estado anterior — o estado inorgânico —, e a pulsão sexual (Eros), que estaria continuamente realizando a renovação da vida. O caráter regressivo, compulsivo e irredutível da repetição nos fenômenos observados por Freud corresponderia justamente à essência da pulsão. Todavia, esse caráter regressivo seria próprio da pulsão de morte e não da sexual. “O que ainda nos incomoda é o fato de não podermos provar, justamente no caso da pulsão sexual, a existência de um caráter de compulsão à repetição” (Freud, 1920/2006, p. 176).

Na esteira dessa tematização, André Green (1986/1988) afirma que a dificuldade maior encontrada na teoria freudiana consistiria em detectar um representante psíquico para a pulsão de morte, análogo ao que a libido representa para Eros por meio da função sexual. O aspecto essencial da última seria a transformação sofrida pela excitação pulsional. De pura tensão psíquica, a moção pulsional torna-se uma força vinculada à representação e, mais fundamentalmente, ao objeto. Em contrapartida, haveria uma força de desligamento, manifesta por meio de uma função desobjetalizante, expressão da pulsão de morte no psiquismo. Esta, por sua vez, visaria à ruptura, ao esfacelamento e destruição dos vínculos pulsionais. Dentro desse panorama, a concepção ampla de masoquismo, argumentada por Freud (1924/2007) poucos anos após a introdução da pulsão de morte, colocaria em evidência o fato paradoxal do prazer libidinal na experiência de dilaceração dos vínculos de Eros.

Em outras palavras, o prazer masoquista apresentaria uma antítese, tendo como dimensão subjacente a satisfação libidinal na experiência da dor. Experiência compreendida aqui como perturbação psíquica resultante de uma efração, do rompimento de barreiras internas protetoras pelo afluxo de energia não ligada (Freud, 1920/2006, 1924/2007; Laplanche, 1970/1985). Como bem pontua Rosenberg (1991/2003), “o masoquismo é um prazer da dor, prazer do sofrimento e, em última instância, prazer do desprazer” (Rosenberg, 1991/2003, p. 71). Não é difícil perceber que a própria definição de masoquismo é contraditória, paradoxal.

Na esteira desse paradoxo, Freud (1924/2007) introduziu O problema econômico do masoquismo, justamente a partir do questionamento sobre a relação entre os fenômenos masoquistas e o princípio de prazer. Diante do supracitado pressuposto clássico de que os processos psíquicos seriam regidos por uma tendência à obtenção de prazer, os fatos clínicos do masoquismo se apresentariam como ininteligíveis. Isso porque evocariam outra lógica, outra regência, aquela mais próxima de um “além do princípio de prazer”. No célebre texto de 1924, Freud revisou e aprofundou suas considerações sobre o assunto. Distinguiu três notáveis categorias de masoquismo, todas concatenadas: (1) erógeno, (2) feminino e (3) moral. O masoquismo erógeno e primário, protótipo de todas as formas de masoquismo, estaria referido a uma circunstância da excitação sexual, associada à obtenção de prazer na vivência dolorosa, decorrente de uma fusão originária e intransponível entre libido e pulsão de morte. Após grande porção da pulsão destrutiva ter sido transposta para o exterior, em direção aos objetos externos, um resíduo interno, previamente existente, teria permanecido, fixando-se à libido, tornando-se parte integrante desta e tomando o próprio corpo-sujeito como objeto de satisfação.

De modo significativamente diferente, o masoquismo secundário foi definido como a reintrojeção do sadismo — ou seja, um redirecionamento da agressividade voltada ao objeto externo novamente contra o próprio indivíduo —, que ocorreria regularmente por causa da supressão cultural da agressividade (Freud, 1924/2007; Maleson, 1984). Nesse registro secundário, residiriam formas violentas não apenas de masoquismo erógeno (automutilações, privações auto infligidas, etc.), mas, também, dos masoquismos feminino e moral. O primeiro deles (feminino) estaria associado a uma posição de passividade perante o objeto sexual, seja na prática sexual masoquista stricto-sensu, seja em outras circunstâncias figurativamente similares. Já o último (moral) diria respeito a condutas imperativas nas quais o sujeito agiria de forma autopunitiva em diversos aspectos, movido por determinações inconscientes ligadas à culpa edipiana e à fragilidade da interdição de impulsos incestuosos e agressivos.

Chabert (2006, 2014) sugere que essa intrincada distinção entre diferentes classes de masoquismo empreendida em 1924 se revela tremendamente frutífera para a psicopatologia e a clínica psicanalítica contemporâneas. “Longe de produzir formações sintomáticas raras, o masoquismo é descoberto na origem e no desdobramento de sofrimentos psíquicos agudos, que parecem atualmente estarem a caminho da inflação ou mesmo do agravamento”, nos diz a autora (Chabert, 2006, pp. 5-6; tradução nossa).

Nessa exata direção, em trabalho anterior (Klier e Winograd, 2019), defendemos a hipótese de que o masoquismo moral se imporia como uma categoria de singular importância para a compreensão da adicção sexual. Isso porque os seus elementos centrais são o sofrimento, a dor, o fracasso e a autopunição. O masoquismo moral, já na obra freudiana (Freud, 1924/2007), expressaria a transformação de um sentimento inconsciente de culpa em acentuada necessidade de punição por parte do ego em relação a algum poder parental. No contexto da adicção sexual, essa necessidade de punição viria à tona mediante sucessivas atuações via corpo e ato cujas drásticas consequências (internas e externas) serviriam como um ponto de interrupção, coup d’arrêt, recurso extremo de freagem para as intensidades transbordantes em jogo. Na ausência de limites internos bem estabelecidos, o sujeito precisaria desesperadamente testar os limites da realidade externa, colocando-se em situações penosas nas quais a sexualidade assumiria teor extremo e destrutivo (tomadas de risco, auto retaliações, sabotagens diversas, etc.).

Mas, se a necessidade de punição imbuída no masoquismo moral, secundário, compreende uma problemática edípica, resultante de falha extensiva no recalcamento/interiorização de um emaranhado de representações, desejos e interdições, no presente artigo, nosso interesse se dirige aos aspectos pré-edípicos implicados nessa dimensão masoquista — ligados à esfera narcísica, à sexualidade arcaica, pré-genital.

O masoquismo na concepção de benno rosenberg

Na primeira teoria das pulsões, o que estava predominantemente em jogo era a contraposição entre os princípios de prazer e de realidade, a imposição de uma negociação entre os imperativos pulsionais e suas expressões nos meios cultural, social, civilizatório, etc. (Freud, 1915/2004). Após a introdução da pulsão de morte em 1920, subjacente à crescente atenção dedicada a aspectos traumáticos e violentos da vida psíquica, Freud (1924/2007) delineia com maior precisão um terceiro princípio, o de Nirvana, atrelado ao escoamento máximo/absoluto de toda tensão — a primazia do desligamento. Notadamente, diante desse panorama, o princípio de prazer assume outra perspectiva, menos restringida à impetuosidade das pulsões sexuais e mais próxima de uma reivindicação da ligação, uma imposição de Eros perante a ameaça de total desligamento do Nirvana (Freud, 1924/2007).

Se até 1924 o prazer era prioritariamente concebido por meio de um viés quantitativo (diminuição da tensão, da excitação), a partir de O problema econômico, Freud reconhece a inegável influência de fatores qualitativos na obtenção desse prazer. Fatores não tão facilmente identificáveis, ligados ao ritmo, à temporalidade dos fatos psíquicos, à proporção, distribuição e durabilidade das excitações. Ou seja, se antes o prazer apresentava teor mais elementar, primitivo, agora é visto como uma espécie de complexificação da excitação, um desdobramento quanto ao caráter rudimentar do Nirvana, que assumiria o propósito de garantir o mínimo de homeostase, o equilíbrio quantitativo/qualitativo para a manutenção da vida.

Foi no âmbito desse paradigma que Rosenberg (1991/2003) delineou uma engenhosa releitura da problemática do masoquismo. A transformação do Nirvana em princípio de prazer só aconteceria por meio de uma intrincação pulsional, na qual a libido absorveria porções da pulsão de morte, ligando-se a ela. Essencialmente, o autor propôs que não apenas o princípio de prazer, mas, antes e primordialmente, o masoquismo seriam produtos dessa fusão-liga pulsional primária: “São dois rostos, dois aspectos, do mesmo momento psíquico” (Rosenberg, 1991/2003, p. 81).

O masoquismo é aqui entendido num sentido mais amplo, constitutivo, ligado à capacidade do psiquismo de suportar a excitação: “a existência e a duração da organização psíquica dependeriam do masoquismo” (Rosenberg, 1991/2003, p. 84). O núcleo masoquista primário, articulado à dimensão de intrincação pulsional — e, portanto, intrínseco à constituição do Eu—, impediria o imediatismo da descarga, assegurando a duração dos processos psíquicos: a temporalidade-continuidade interna. Esse panorama está referido, evidentemente, a uma vertente estruturante, profícua e fundante do masoquismo.

Por conseguinte, Rosenberg (1991/2003) defende a hipótese essencial de que o prazer masoquista (aquele ligado à tensão, à excitação, ao próprio desprazer) seria o modelo fundamental do princípio de prazer, seu protótipo máximo. “A descarga transfere sua marca (retroação) para a excitação que, por sua vez, não desaparece totalmente na descarga” (Rosenberg, 1991/2003, p. 81). Em outras palavras, o prazer na condição de princípio seria um prazer-desprazer, pois não se reduziria apenas à descarga, mas compreenderia em si gradações diversas de excitação, já que a descarga absoluta iria justamente contra a primazia de seu funcionamento.

Nessa direção, Rosenberg (1991/2003) resgata a noção de realização alucinatória do desejo — que, na concepção freudiana (Freud, 1911/2004), engendraria a capacidade psíquica de “espera-adiamento” da descarga. O desprazer interno (referido ao aumento da excitação) constituiria inevitavelmente uma ameaça para o Eu arcaico do infante, instituindo a situação de desamparo. A satisfação alucinatória emerge nesse cenário como uma solução de espera. Trocando em miúdos, com a ausência intermitente do objeto primário (que ampara e viabiliza o aprazimento das demandas infantis), a criança criaria por vias alucinatórias o objeto circunstancialmente perdido. Assim, determinada carga excitatória encontra satisfação por meio da reprodução alucinatória de percepções, transformadas em imagens mnésicas de experiências de apaziguamento com o objeto no início da vida. “O reaparecimento da percepção é a realização do desejo” (Freud, 1900/1996, p. 595).

Segundo essa lógica, o desejo infantil está ligado a inscrições psíquicas, a traços de memória que são reinvestidos e reativados na ausência do objeto real que propiciou a vivência de satisfação original. Para Rosenberg (1991/2003), esse processo sobretudo autoerótico, condicionado pelo masoquismo erógeno primário, serviria como matriz fundamental da vida representativa do sujeito. Daí o paralelo proposto entre masoquismo primordial e projeção, sendo a realização alucinatória do desejo uma defesa de tipo projetivo.

Conforme o clássico postulado freudiano, o Eu-prazer purificado, versão mais arcaica do Eu, introjetaria os objetos externos que são fontes de prazer e projetaria/deslocaria para o exterior os elementos que são experimentados perceptivamente como desprazerosos no mundo interno (Freud, 1915/2004). Dessa forma, o deslocamento primário (projeção) viabilizaria uma primeira separação entre os domínios do Eu e do não-Eu, abrindo espaço para a constituição (e ulterior reconhecimento) do objeto externo, da realidade externa. O exterior, o objeto, o “odiado” seria, primeiramente, idênticos, equivalentes. Em contrapartida, a realização alucinatória do desejo consistiria em outra modalidade de projeção, que não se confunde com a expulsão de todos os aspectos negativos, ruins, para o exterior do sujeito. Tratar-se-ia de uma projeção “introjetável e introjetada”, nas palavras do próprio Rosenberg (1991/2003, p. 95) — responsável, em última instância, pela constituição do objeto interno.

Na adicção sexual, Estellon (2002) propõe que um dos aspectos determinantes seria a precariedade de produções simbólicas derivadas da realização alucinatória do desejo — sustentáculos, pilares do autoerotismo, capazes de produzir presença na ausência, tributárias de uma posição/capacidade depressiva. Como visto, na leitura de Rosenberg (1991/2003), essa consolação alucinatória, estruturante e estruturadora, estaria subordinada a um núcleo masoquista primário, imprescindível à manutenção da vida psíquica (onírica, representativa). Os impasses e rupturas sofridos por esse núcleo promoveriam um distúrbio no equilíbrio dos processos anímicos, desvelando outra face do masoquismo, mortífera e desestruturante.

Regressão sensorial na adicção

Estellon (2002) define o sex-addict como “adicto do corpo sensorial” (p. 188; tradução nossa). A excitação sexual torna-se perniciosa, transbordante, delineando o que ele caracteriza como um “circuito curto”, primado do impulso. Logo, “o prazer sensorial tomado sobre o próprio corpo bascula em funcionamento autocrático fechado sobre si mesmo” (Estellon, 2014, p. 91; tradução nossa). O envoltório constituído pela excitação sensorial viria anestesiar uma intolerável e dificilmente elaborável força de desligamento. O recurso excessivo ao campo sensorial, à intensidade das sensações, serviria como maneira de evitar, na subjetividade, a posição depressiva.

Nesse exato contexto, René Roussillon (1999/2012) identifica os casos-limite como sofrimentos identitário-narcísicos, que põem em dificuldade a função integrativa do sistema egoico, podendo resultar em patologia severa do narcisismo. As esferas da percepção e da sensação tendem a tomar a frente da ordem representativa. O que se dá como corporeidade, objetividade, se imporia aos primados da fantasia e do princípio de prazer. Em contraposição ao modelo da neurose, no qual predomina a questão do retorno do recalcado, o autor propõe o modelo da clivagem ao ego para as patologias narcísicas, priorizando o argumento do “retorno do clivado” e das defesas que esse retorno incita. Trata-se da hipótese de uma organização defensiva contra os efeitos de um traumatismo primário, arcaico e clivado — que, ao não receber estatuto intrapsíquico, ameaçaria constantemente a organização da vida subjetiva.

A dialética entre presença e ausência seria construída bem no início da vida psíquica, estando intrincada à qualidade das interações e laços precoces que injetam certo ritmo na vida de relação. Inspirado pela descrição de Donald Woods Winnicott (1971/1975) acerca da harmonização primária dos ritmos, Roussillon (1999/2012) descreve como a irregularidade rítmica na relação com o objeto primário provocaria no infante a impressão de um mundo incontrolável, imprevisível (Ravit, 2004). As arritmias precoces favoreceriam a emergência de um núcleo de “culpabilidade primária”, que se expressaria por meio do sentimento de inabilidade em criar um contingenciamento interno satisfatório e adaptável. A exigência de trabalho psíquico imposta pelo ambiente excederia as capacidades representativas do sujeito, tornando-o refém de uma violência que o colocaria num dilema defensivo. Ou o infante tentaria manter a relação de objeto indistinguível do narcisismo primário, onde as fronteiras “eu/outro” são demasiadamente porosas; ou tentaria submeter-se às exigências intrusivas do ambiente. Em ambos os casos, estabelecer-se-ia uma clivagem, uma segmentação sobre o sistema egoico, engendrando difuso sentimento de mal-estar com o qual o sujeito se identificaria. “Em vez da forma matricial da ilusão narcísica primária: ‘Eu sou o seio’ (…) instaura-se uma ilusão negativa na origem do núcleo da culpabilidade primária: ‘Eu sou (o) mal’” — pontua Roussillon (1999/2012, p. 83; tradução nossa). Ou seja, o indivíduo assumiria as falhas do ambiente primário, identificando-as como uma produção própria.

Posteriormente, esse mal-estar originário se apresentaria indiretamente, por meio de comportamentos psíquicos bastante reativos à sua presença hostil, cuja função seria a de contrainvestir sua emergência no psiquismo, com a finalidade última de alcançar o apagamento absoluto de seus traços de memória. Trata-se de uma lógica singular, pré-edipiana, que pode ser inferida a partir dos estudos freudianos posteriores ao tournant de 1920. Uma ruptura traumática do sistema para-excitação veio a produzir uma experiência psíquica inesquecível, não passível de integração egoica, confinada ao automatismo da repetição.

Uma das possíveis consequências dessa dinâmica seria o aparelho psíquico tentar tratar a experiência traumática, enlaçando-a com o suporte de uma co-excitação libidinal, exigência direta do princípio de prazer — solução masoquista, tentativa de “sexualização” do traumatismo (Roussillon, 1999/2012). Essa perspectiva nos aponta um caminho para pensarmos a dimensão masoquista dos fenômenos da compulsão à repetição, especialmente aqueles implicados na gênese da adicção.

Magali Ravit (2004, 2006) indica como o laço do sujeito com o objeto da adicção promoveria uma espécie de ligação pré-simbólica de experiências sensoriais, primitivas e caóticas. A aderência cega ao objeto — que, no caso da adicção sexual, seria a própria atividade/excitação sexual — conduziria a uma relação de padecimento induzido, de tonalidade masoquista. Isso porque o sistema adictivo daria ao excesso traumático uma direção, um circuito que, a despeito de sua precariedade, permitiria reduzir e canalizar a fração das pulsões destrutivas internas, derivadas do núcleo de culpabilidade primária.

De modo contrário, essas pulsões teriam efeito ainda mais devastador e mortífero. O objeto, exteriorizado por excelência via corpo e ato, passaria a ter domínio sobre a vida psíquica do adicto. Dada a fragilidade de estruturação da satisfação alucinatória do desejo, operações primitivas de atribuição seriam retomadas, a partir da divisão do objeto em “bom” ou “mau”, num esforço de requalificação das sensações. Por conseguinte, a patologia adictiva assumiria a função de um dispositivo de urgência, sistema-limite, sobretudo econômico, no qual a falta e o consumo do objeto produziriam artificialmente uma experiência rítmica mais subjetiva, na ausência de tessitura emocional que pudesse prover conforto e segurança aos estados aflitivos internos.

As sensações-percepções que se mantiveram estranhas, perturbadoras e pouco qualificáveis após o traumatismo original seriam contra investidas na particularidade dessa economia. A carga excitatória impermeável à elaboração seria assimilada por meio dos ritmos de absorção e falta. E seria em termos binários (boa sensação/má sensação, objeto bom/objeto mau) que a vida, reduzida a uma “pele de tristeza”, nas palavras de Ravit (2006, pp. 200–201; tradução nossa), adquiriria sentido. Criar-se-ia uma espécie de prótese psíquica, com seus prejuízos e reveses. Superinvestido, o objeto da adicção terminaria por se tornar o fiador da experiência emocional. No entanto, as emoções permaneceriam experiências somáticas, não passíveis de delegação à psique sob a forma de representantes.

O que se verifica na adicção sexual, a nosso ver, seria justamente uma constante regressão a essa dinâmica elementar, fronteiriça. O sujeito responderia a uma situação psíquica adversa refugiando-se no campo estrito das sensações corporais e suas variações. A resposta sexual compulsiva ao traumático, ao transbordamento pulsional interno, se tornaria inerente a qualquer afeto de angústia, não abrindo espaço para os devaneios autoeróticos. O afeto subsequente à separação/aproximação do objeto não seria apreendido psiquicamente, sendo transferido para uma sensação corporal de falta. Ao esquivar-se do sentimento depressivo, atrelado à qualidade da presença ou ausência do outro, o sujeito sofreria imerso em uma atividade na qual julgaria poder regular a si próprio com maior facilidade (Estellon, 2014). Trata-se, em última instância, de um recurso defensivo que visaria a preservar um investimento mínimo com o propósito de limitar a descarga pulsional absoluta, desenfreada. Se o laço adictivo se apresenta essencialmente como tirânico e cruel é porque ele se torna o detentor da sensorialidade, garantindo paradoxalmente uma função vinculativa, ainda que provisória e insuficiente.

Nesta dupla valência entre criação e destruição, Ravit (2004, 2006) retoma a especificidade do masoquismo segundo a concepção de Rosenberg (1991/2003), na qual há importante distinção entre masoquismo de vida e de morte. Se a típica sucessão satisfação/falta nas condutas adictivas emerge como uma tentativa de erotização de estados profundamente dolorosos frente ao fracasso de estruturação da realização alucinatória do desejo, esse esforço defensivo terminaria por frequentemente colocar o sujeito diante de um masoquismo que o aproximaria da morte psíquica.

Transmutações do masoquismo

Vimos que Rosenberg (1991/2003) considera que as modalidades de realização alucinatória do desejo estariam subordinadas à consolidação de um núcleo masoquista primário, como garantia do sentimento de continuidade interna, permitindo à criança (e, posteriormente, ao adulto) suportar a situação de desprazer. Esse desprazer implica em uma sustentabilidade da dor, uma aprendizagem da mesma — que seria, por essência, masoquista, e que viabilizaria a co-excitação libidinal do estado de tensão. Isso concerne, inequivocamente, a um masoquismo guardião da vida, que permite o investimento da excitação, sua ligação, tornando-a aceitável e suportável. A extinção em níveis radicais da excitação leva ao rompimento dos vínculos, à dissociação. Ao frear a necessidade de extinção imediata e conservar a presença mínima de excitação no seio da descarga, impedir-se-ia que esta fosse um ponto de descontinuidade, uma ruptura traumática (Rosenberg, 1991/2003).

No caso de um colapso desse masoquismo guardião, o sujeito sentir-se-ia inclinado a buscar um sofrimento masoquistamente investido, alguma derivação própria do masoquismo secundário, com a finalidade de mitigar o esvaziamento interior, a fissura instaurada no âmbito da vida representativa — uma forma de reestabelecer certo equilíbrio. Nesse sentido, Rosenberg (1991/2003) propõe que as formas secundárias de masoquismo, como o moral, por exemplo, vêm tentar contrabalançar as frestas no funcionamento do núcleo masoquista primordial — o que só é possível pela identidade de natureza entre os dois. Trata-se de um esforço de restauração constante nas organizações psíquicas mais diversas, resultando em uma hierarquia complexa e heterogênea de fenômenos masoquistas, com variados graus de magnitude e intensidade. Em situações extremas,

Para enfrentar a ameaça de desintrincação do núcleo masoquista o eu (…) sacrifica o sadismo, retira a libido objetal inclusa, introjeta-a, para reafirmar assim este mesmo núcleo masoquista e assegurar a ligação da pulsão de morte; mas, essa retirada-introjeção de libido objetal libera por desintrincação pulsional pulsões destrutivas que ameaçam o eu; ele reage, então, por uma introjeção renovada de libido objetal, e assim por diante (…) Se isso é verdade, esse masoquismo secundário torna-se verdadeiramente mortífero, já que realiza um processo-escalada que só pode parar com a morte. (Rosenberg, 1991/2003, p. 115)

Ou seja, com a exacerbação do masoquismo secundário, haveria uma dissolução progressiva do sadismo e, nesse desequilíbrio, a inclinação masoquista (seja moral, feminina ou literalmente erógena) desvelaria um masoquismo mortífero, cuja propensão autodestrutiva assumiria proporções dramáticas. Se na teoria freudiana clássica, significativas parcelas da pulsão de morte são projetadas em direção aos objetos externos com o auxílio da libido via sadismo (Freud, 1924/2007), o masoquismo mortífero vem tornar obsoleta essa projeção, esse redirecionamento para fora. À medida que o sadismo fracassa em desempenhar o papel de defesa e equilíbrio quanto ao masoquismo em geral, a potencialidade mortífera do último tomaria a frente da cena. Seriamente prejudicado, o núcleo masoquista erógeno do ego daria margem a uma espécie de desvario das excitações.

Masoquismo mortífero: o prazer da excitação

O masoquismo mortífero está referido à intensificação mórbida do investimento da excitação, de seus acúmulos e desprazeres. Como exemplo, Rosenberg (1991/2003) menciona casos de psicóticos que não sentem dor ao se automutilarem. Provocam sérias lesões nos próprios corpos continuamente. O prazer é procurado quase que exclusivamente pela dilatação, por meio da expansão da experiência excitatória. Ao contrário do masoquismo guardião da vida, essa vertente mortífera não se contentaria apenas em libidinizar a força destrutiva não transposta ao exterior, mas, desconcertantemente, a reteria, assenhorando-se de uma potência progressivamente destrutiva para o prazer e a dor. Não se trata mais de tornar a excitação circunstancialmente agradável e suportável, mas de aguçá-la, potencializá-la indefinidamente, prolongá-la, a despeito de suas consequências nocivas. “O corolário dessa atitude é que a descarga como satisfação objetal torna-se, no limite, supérflua, e em última instância impossível” — destaca Rosenberg (1991/2003, p. 109). Haveria grave deslocamento da satisfação com o objeto, considerado em sua diferença, individualidade e alteridade, à excitação bruta engendrada por condutas que prescindem de um investimento objetal propriamente dito, seja na realidade externa, seja na fantasia (como no panorama neurótico, por exemplo).

Por esse ângulo, vale questionar se, no extremo, a patologia do sexo adictivo não levaria o sujeito a um processo semelhante de concentração mortífera da excitação. Conforme indicou Ravit (2004, 2006), as condutas adictivas, ao mesmo tempo que instituem uma medida de urgência contra o impacto de traumatismos primários no funcionamento psíquico, também se impõem como uma frágil estratégia defensiva, na qual o adicto seria absorvido por uma crescente alienação objetal e simbólica, articulada a um traiçoeiro império dos sentidos. Na ausência de inscrição de uma qualidade psíquica que poderia prover consistência emocional e afetiva à experiência sensorial, repetir-se-ia incessantemente o ato adictivo, por meio de imersões na esfera quantitativa da experiência. “O que está na ordem de uma ameaça de morte para o psiquismo é repetido sobre o plano somático” (Ravit, 2004, p. 57, tradução nossa).

Sabe-se que, na adicção sexual, importaria menos a construção de um vínculo (afetivo, amoroso, representativo) com o objeto/parceiro (a) sexual e mais a exacerbação da excitação, da tensão sexual que não se esgota. Não por acaso, Estellon (2002, 2005) compreende a busca do sex-addict como uma caça por “corpos sem rosto”, sem nome, sem história, sem subjetividade. O parceiro sexual tenderia a se tornar, de diferentes formas, um objeto descartável e facilmente substituível. Neste deslocamento do objeto à excitação, estamos possivelmente diante de uma captura do sex-addict pelos domínios de uma vertente mortífera do masoquismo. Afinal, o sex-addict quer sempre mais. Seu prazer estaria predominantemente atrelado à busca de excitação. A despeito da descarga procurada, o ímpeto sexual, de certa forma, seria investido masoquistamente. Consumista e voraz, a adicção não comportaria apaziguamento. “O masoquismo mortífero tende a realizar assim uma espécie de autismo masoquista centrado na excitação em si” (Rosenberg, 1991/2003, p. 110). Na literatura psicanalítica sobre o tema da adicção sexual (André, 2022; Estellon, 2014, 2020; Robert, 2022), bem como em nossos atendimentos clínicos, essa instigante inclinação é observável de diferentes maneiras, conforme apresentamos extensivamente neste estudo.

Não por acaso, Rosenberg (1991/2003) define o masoquismo mortífero como o prazer da excitação, a despeito das graves consequências que essa dilatação excitatória pode acarretar no funcionamento psíquico. Dentre elas, talvez a mais grave seja a desafetação de outras formas de defesa, particularmente da projeção. A projeção primária, seja em sua modalidade tradicional, responsável pela constituição do objeto externo, seja em sua modalidade introjetável e introjetada, encarregada pela fundação do objeto interno, tornar-se-ia progressivamente esvaziada. Na base disso, estaria o decréscimo violento do apelo à realização alucinatória do desejo, bem como do deslocamento dos elementos perceptivamente designados como ruins para o exterior. Logo, em proporções extremadas, o investimento masoquista da excitação vem tornar inútil a projeção e, subsequentemente, a relação de objeto que emerge a partir dela. O resultado mais danoso desse processo, como já mencionado, é uma severa pane no redirecionamento da agressividade para o exterior. Se o papel do masoquismo se torna preponderante no que concerne à projeção, proporcionalmente a essa mudança, sua vertente mortífera toma a frente da cena. No abandono progressivo do objeto interno/externo e, por conseguinte, nas reintrojeções sucessivas do sadismo, um curto-circuito na vida psíquica se instaura e se cronifica. Esse ciclo vicioso confinaria o sujeito em seu ímpeto irrefreável à autodestruição, de caráter paradoxalmente lascivo e lancinante, fenômeno amplamente visível nos casos de sexualidade adictiva.

Considerações finais

Pode-se dizer que o sex-addict, na radicalidade de sua busca, estaria inserido em uma tortuosa lógica de satisfação, na qual há constante regressão a uma esfera rudimentar e predominantemente sensorial da psicossexualidade. Por meio de involuntária e permanente destituição narcísica e representativa do objeto, o apelo incessante ao sexo, ao mesmo tempo que pode ser compreendido como uma estratégia defensiva, medida de urgência contra um colapso psíquico iminente, desembocaria frequentemente na captura do sujeito por um traiçoeiro domínio excitatório, mediante uma espécie de culto mórbido às sensações. No limite, esse movimento regressivo levaria a uma concentração mortífera da excitação, na qual os deslocamentos projetivos (seja por meio da realização alucinatória do desejo e seus derivados, seja por meio de um investimento significativo nos objetos externos) se esvaziariam paulatina e progressivamente, tornando o sujeito refém de uma vinculação cruel e prejudicial ao próprio impulso sexual. Por meio de práticas diversas, a extensão e perpetuação da excitação o colocariam em situações de acentuada vulnerabilidade física e psíquica. Fundamentalmente masoquista e coercitiva, a intimação ao sexo, a despeito de seu caráter defensivo, terminaria por se tornar uma arma letal, utilizada contra a vida psíquica, contra o próprio sujeito, simultaneamente anestesiado e capturado pela tirania da excitação.

Quanto a possíveis indagações sobre o tratamento psicoterapêutico da adicção sexual, quadro psicopatológico cuja crescente incidência no panorama das subjetividades contemporâneas insiste em colocar à prova a psicanálise em seus domínios de atuação, nos parece válido tecer algumas breves considerações. Sabe-se que a psicanálise se ocupa da investigação de um sujeito singular, com uma história subjetiva, constituída por fatores diversos e heterogêneos (culturais, sociais, representativos). A adicção é um dos elementos de sua existência. O objetivo do tratamento, portanto, não se resume estritamente à erradicação do comportamento adictivo, mas, sim, à escuta do paciente em sua integralidade, com suas perturbações emocionais, defesas erigidas, conquistas e dificuldades múltiplas (Estellon, 2014; Saïet, 2019). Deve-se ter precaução quanto à possível limitação da escuta analítica aos aspectos estritamente ligados ao seu quadro psicopatológico ou à dependência patológica apresentada. O trabalho investigativo que a análise promove incide sobre o que subjetivamente impele seus movimentos. Envolve uma reflexão que abrange diversos aspectos de sua existência, adjacentes à adicção (Saïet, 2019).

Para Estellon (2014), o processo psicoterapêutico com o sex-addict deve prover um setting cuja configuração é flexível, mas robusta, na qual o paciente aprende gradualmente a manter um ritmo, uma constância na relação com o analista. Um dos primeiros objetivos é propiciar as condições para que o sujeito possa manter um investimento libidinal sólido no processo. Caso contrário, o tratamento é abandonado após situações em que é exposto à frustração, aos incômodos e dores inerentes à análise. A clínica psicanalítica deve prover um modelo de constância relacional (estável, cadenciada, rítmica) que o analisando poderá apreciar e potencialmente transpor para a sua vida afetiva e sexual.

Como nos afirma Eduardo Cavalcanti de Medeiros e Carlos Augusto Peixoto Junior (2017), o tratamento de quadros marcados por uma frágil constituição das fronteiras psíquicas exige uma reconfiguração da técnica psicanalítica. Deve-se repensar a manutenção rigorosa do modelo de análise baseado estritamente na posição de neutralidade, atenção flutuante e interpretação por parte do analista, e a regra da associação livre por parte do analisando. O acolhimento e sustentação no setting analítico de vivências traumáticas, reatualizadas incessantemente, constituiriam os objetivos predominantes. As contribuições de Sándor Ferenczi (elasticidade da técnica, tato do analista), Donald Woods Winnicott (Holding) e Michael Balint (passividade elástica) são imprescindíveis nesse panorama (Balint, 1933/1952; Ferenczi, 1928/2011; Winnicott, 1962/2008, pp. 55–61). Atenta-se para a qualidade afetiva das intervenções no setting analítico, “uma vez que esse espaço é pensado como um lugar no qual possam ocorrer regressões que visem à integração de falhas ocorridas nos processos iniciais de subjetivação” (Medeiros e Peixoto Jr., 2017, p. 56). As capacidades empáticas do analista, o acolhimento de manifestações regressivas, a criação e manutenção de uma relação pautada na confiança com o paciente tornam-se aspectos fundamentais do tratamento.

Nos parece de especial relevância o que diz Estellon (2005) sobre o que a psicanálise pode oferecer ao sujeito coagido pela adicção sexual:

A doença, em termos aristotélicos, é quando Eros (que estava em excesso) é aprisionado dentro do corpo. Quando o sujeito é consumido (…) por um padecimento psíquico, apenas a transferência (o movimento de Eros) é potencialmente capaz de colocar novamente em circulação o que permaneceu aprisionado. (p. 77, tradução nossa)

A circulação das palavras estabelece um avanço no processo de humanização. Thierry Roth (2020) defende postulado similar: o analista vai personificar para o analisando as leis da linguagem, o peso do simbólico. Limites que podem servir como ancoragem e viabilizar a construção de um abrigo psíquico. Nesta desobstrução de Eros, residiria a aposta.

Financiamento

Pesquisa financiada pelo Programa Pós-Doutorado Nota 10 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (PDR Nota 10/FAPERJ). Processos nº E-26/202.405/2017 e nº E-26/202.406/2017.

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Ney Klier

Psicanalista; pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Doutor em Teoria Psicanalítica pela Universidade Federal do Rio de Janei­ro (UFRJ). Rio de Janeiro/RJ, Brasil.
neyklier@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-3809-479X

Monah Winograd

Psicanalista; professora associada do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clí­nica do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); coordenadora do Laboratório de Pesquisas Avançadas em Psicaná­lise e Subjetividade (LAPSU). Doutora em Teoria Psicanalítica pela Universidade Fe­deral do Rio de Janeiro (UFRJ). Rio de Janeiro/RJ, Brasil.
monahwinograd@icloud.com
https://orcid.org/0000-0002-9388-4014

Formato de citación

Klier, Ney, & Winograd, Monah. (2025). A tirania da excitação: adicção sexual e masoquismo mortífero. Quaderns de Psicologia, 27(2), e2163. https://doi.org/10.5565/rev/qpsicologia.2163

Historia editorial

Recibido: 28-04-2024
1ª revisión: 21-08-2024
Aceptado: 26-09-2024
Publicado: 29-08-2025

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1 Codina e Hautefeuille (2016) não mencionam dados estatísticos específicos, mas enfatizam a visibilidade do fenômeno por meio de uma crescente produção acadêmica e científica por profissionais de saúde, pesquisadores e sociólogos. Essa produção é apresentada e discutida na edição da Psychotropes referida no presente artigo.

2 A produção deste artigo está vinculada à pesquisa de pós-doutorado “Entre a dor e o prazer: masoquismo e adicção sexual”, de caráter teórico e clínico-qualitativo, realizada na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). O eixo clínico-qualitativo da pesquisa abarca o atendimento psicoterapêutico com orientação psicanalítica a pacientes de ambos os sexos que apresentam o quadro da adicção sexual no Serviço de Psicologia Aplicada da instituição. Os relatos de caso aqui expostos são baseados em dados colhidos nesses atendimentos clínicos, aprovados pela Plataforma Brasil (Parecer nº 2.439.483) e pelo Comitê de Ética da PUC-Rio. Os nomes utilizados para os pacientes neste artigo são pseudônimos.

3 As três vinhetas apresentadas constituem fragmentos de casos clínicos vinculados à pesquisa de pós-doutorado “Entre a dor e o prazer: masoquismo e adicção sexual”, descrita previamente. Vale ressaltar que os pacientes atendidos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, a partir do qual são informados sobre o caráter de ensino e pesquisa do trabalho realizado. Os nomes mencionados nas vinhetas são fictícios. Para informações adicionais, ver nota de rodapé II.

4 Segundo uma série de revisões, amostras e levantamentos realizados nos últimos vinte e cinco anos (Ajegena et al., 2018; Black, 2000; Estellon, 2014; Karila et al., 2014), estima-se que a incidência do quadro varia entre 3% e 6% na população adulta geral dos Estados Unidos. As evidências sugerem que o quadro tem ocorrência maior em pessoas do sexo masculino, tendo como proporção estimada 3 a 5 homens para cada mulher (Ajegena et al., 2018; Black, 2000; Estellon, 2014; Karila et al., 2014). No eixo clínico-qualitativo de nossa pesquisa, conforme explicitado nas notas de rodapé II e III, a proporção foi similar aos estudos supracitados. Dos pacientes que procuraram atendimento psicoterapêutico no Serviço de Psicologia Aplicada da PUC-Rio, 75% foram homens e 25% mulheres (doze homens e quatro mulheres). Dos pacientes que deram prosseguimento ao processo psicoterapêutico por um período acima de doze meses, 87.50% foram homens e 12.50% mulheres (sete homens e uma mulher). Quanto à relação entre a temática metapsicológica do presente artigo e as normas de gênero, destacamos que seriam necessários estudos complementares que, no recorte específico do texto atual, ultrapassam o escopo da linha de argumentação.

5 A prática do cruising, no contexto da adicção sexual, está referida ao ato de o sujeito divagar por diferentes lugares e espaços por tempo indeterminado com o propósito de conseguir uma atividade ou um parceiro sexual (Estellon, 2014).