Quaderns de Psicologia | 2024, Vol. 26, Nro. 1, e1995 | ISNN: 0211-3481 |
https://doi.org/10.5565/rev/qpsicologia.1995
Daniel Oliveira Zacarias
Universidade de Brasília
Rizzia Daphne Andrade Almeida
Centro Universitário de Brasília
João Gabriel Modesto
Universidade Estadual de Goiás
Resumo
A Teoria dos Fundamentos Morais postula que liberais e conservadores são orientados por fundamentos morais distintos, o que pode ser usado como estratégia de persuasão política, bem como influenciar no comportamento de voto. No presente trabalho, realizamos quatro estudos. Os participantes responderam a um instrumento online composto pelo Questionário de Fundamentos Morais, uma medida de intenção de votos e informaram dados demográficos. Nos estudos foram identificados que a tendência individualizante influenciou a intenção de votos a candidatos de esquerda, enquanto a tendência coesiva influenciou a intenção para candidatos de direita nas eleições presidenciais de 2018 e 2022. Conclui-se que a TFM é um modelo robusto para compreensão de aspectos do comportamento político brasileiro.
Palavras-chave: Teoria dos Fundamentos Morais Moralidade Política Intenção de Voto
Abstract
The Moral Foundations Theory postulates that liberals and conservatives are guided by distinct moral foundations, which can be used as a strategy for political persuasion, as well as influencing voting behavior. In the present paper, we carried out four studies. Participants responded to an online instrument composed of the Moral Foundations Questionnaire, their intention to vote, to assign the position to candidates for the presidency, and their demographic data. The studies identified that the individualizing foundations influenced the intention to vote for left-wing candidates, while the binding foundations influenced the intention to vote for right-wing candidates in Brazil’s 2018 and 2022 presidential elections. Therefore, the MFT is a robust model for understanding aspects of Brazilian political behavior.
Keywords: Moral Foundations Theory Morals Politics Vote Intention
O atual cenário político brasileiro tem sido marcado por instabilidades. Em um período de menos de três anos (2016–2018), ocorreu a prisão de um ex-presidente (Luís Inácio “Lula” da Silva), um impeachment (Dilma Roussef), e a eleição de um presidente de extrema direita (Jair Messias Bolsonaro), que declarou preferir ter um filho morto a um filho homossexual (“O que Bolsonaro…”, 2018), chamou um dos principais torturadores da ditadura militar brasileira de “herói nacional” (“Bolsonaro afirma que…”, 2019), relatou “não ser coveiro” ao ser questionado sobre o número de mortes na pandemia (Coletta, 2020) dentre outras falas polêmicas que perpassam o campo da moralidade. Em 2019, o ex-presidente Lula foi solto devido ao reconhecimento, pela justiça, de inconsistências no devido processo legal. Posteriormente, ele se reelegeu nas eleições de 2022. Esses episódios têm favorecido uma situação de polarização política no Brasil (Gloria-Filho e Modesto, 2019) que tende a se acentuar no período das eleições presidenciais do país. Nesse contexto, a presente pesquisa buscou investigar o período eleitoral brasileiro, com base na Teoria dos Fundamentos Morais (Graham et al., 2009; Haidt e Joseph, 2004), tendo como objetivo analisar a influência dos fundamentos morais na intenção de votos a candidatos para presidência nas eleições brasileiras de 2018 e de 2022.
Os estudos no campo da Psicologia da Moral, em meados de 1970, eram delimitados a duas concepções de moral que visavam compreender como os indivíduos desenvolviam o entendimento sobre percepções de justiça e cuidado ao próximo (Graham et al., 2013). A concepção de moralidade sobre justiça diz respeito à distinção daquilo que é e não é justo, enquanto a concepção de cuidado permeia a noção de proteção do outro, particularmente dos vulneráveis. Por mais que os pesquisadores da época considerassem essas duas fundações distintas, ambas têm um aspecto em comum: o foco no auxílio e proteção dos indivíduos.
A Teoria dos Fundamentos Morais (TFM) promove um avanço nesse entendimento, ao afirmar que moralidade é multidimensional e que deve ir além das concepções de justiça e cuidado que antes eram consideradas as bases da moralidade. Essa teoria parte do pressuposto de que a moralidade é uma forma de proteção dos indivíduos, se configurando como valores, práticas e mecanismos psicológicos que controlam o egoísmo humano, tornando possível a vida em sociedade (Haidt, 2008). A teoria possui ainda como pressuposto que as instituições morais são derivadas de uma estrutura psicológica que se articula com questões culturais e práticas sociais (Haidt, 2007). Os autores, assim, pretendem evidenciar as variações intergrupais e transculturais no julgamento moral como também diminuir a barreira de entendimento das virtudes morais entre liberais e conservadores, criando, dessa maneira, diálogo entre os extremos (Haidt, 2007).
Os autores identificam que esses fundamentos possuem caráter adaptativo, em que a mente moral precede a experiência, sendo assim uma estrutura inata (Haidt e Joseph, 2008). Com isso, pode-se dizer que há uma predisposição ao desenvolvimento de fundamentos morais, em que esse processo será dado de maneira diferente de acordo com a aprendizagem de cada um em seu contexto cultural (Haidt, 2007). Esses mecanismos psicológicos são, portanto, maleáveis, e podem variar de acordo com cada grupo social (Haidt, 2007). A partir disso, foram inicialmente identificados cinco sistemas psicológicos que produzem reações afetivas que influenciam as percepções que o indivíduo tem sobre o mundo (Haidt e Graham, 2007), sendo estes: dano/ cuidado; justiça/ reciprocidade; pertencimento/ lealdade; autoridade/ respeito; pureza/ santidade.
Os mamíferos precisam cuidar de sua prole para que esta permaneça viva, sendo esse cuidado essencial para o sucesso evolucionário da espécie. O fundamento de dano/cuidado diz respeito a essa característica. Para os seres humanos, esse fundamento abarca não só o cuidado de sua própria prole, mas de qualquer ente que possa representar essa vulnerabilidade ou infantilidade (Graham et al., 2013). Esse gatilho tem como output o sentimento de compaixão, visto que o indivíduo se sente motivado a agir de forma a aliviar o sofrimento do outro e protegê-lo. Há, portanto, o desafio adaptativo de proteger os mais jovens e os vulneráveis, o que leva ao sentimento de compaixão e que, consequentemente, faz com que características como cuidado e bondade sejam vistas como virtudes morais em oposição à crueldade (Franks e Scherr, 2015; Haidt e Graham, 2007)
O segundo fundamento, o da justiça/ reciprocidade, diz respeito a uma tendência do ser humano ter reações emocionais diante de situações de traição ou cooperação, a partir do momento em que isso lhe toca em um nível individual de interesse (Graham et al., 2013; Silvino et al., 2016). A cooperação entre indivíduos gera benefícios, logo, diante de situações de traição, há um gatilho para o sentimento de raiva, assim como, diante de situações de cooperação, há um gatilho para sentimentos de gratidão (Haidt, 2013). Assim, reconhece-se a justiça e honestidade como virtudes morais (Haidt e Joseph, 2008).
O fundamento de pertencimento/ lealdade tem como base a tendência gregária do ser humano de criar e entrar em grupos que competem com outros grupos. Estes podem ser tribos, gangues, times, dos quais quanto mais os indivíduos se entregam pelo bem comum do grupo, maior a tendência deste ser altamente vigilante e punitivo contra traidores e aproveitadores. Ou seja, diante dos benefícios gerados a partir da cooperação, ao sinal de ameaças ao grupo, há uma tendência de se estabelecer um maior sentimento de pertencimento por parte daqueles que compõe o grupo, e, consequentemente, sente-se raiva em relação àqueles que não pertencem ao grupo (Haidt e Graham, 2007; Silvino et al., 2016). Características como lealdade, patriotismo e altruísmo passam a ser valorizadas em detrimento à traição e covardia (Haidt e Joseph, 2008).
Autoridade/ respeito se refere aos aspectos psicológicos e sociais estabelecidos em dominações hierárquicas. É importante ressaltar que a autoridade é uma via de mão dupla: assim como os subordinados devem mostrar respeito e consideração, os superiores devem proteger seus subordinados de ameaças externas, mantendo a ordem dentro do grupo (Haidt e Graham, 2007). Ou seja, a partir do estabelecimento de hierarquias sociais, há dominância e subordinação que podem gerar sentimentos de respeito e medo ao superior. Logo, comportamentos de obediência e consideração são valorizados em sociedades autoritárias (Haidt e Joseph, 2008).
O quinto fundamento diz respeito à pureza/santidade. O ser humano foi capaz de desenvolver capacidades cognitivas e emocionais de adaptação relacionadas ao desgosto, o que faz com que sejamos cuidadosos em relação àquilo que comemos (Franks e Scherr, 2015). Em algumas sociedades, essa capacidade de distinção corrobora com ideias de sacralidade, saber distinguir o que é divino do que é profano. Dessa forma, aspectos como castidade e temperança tendem a ser valorados em detrimento da luxúria e intemperança. Assim, o que antes era um desgosto relacionado aos cuidados de alimentação passa a ter um valor religioso e simbólico, possivelmente dando origem a tabus sociais (Haidt e Joseph, 2008).
Esses cinco fundamentos podem ser organizados em duas categorias, uma que se refere aos valores relacionados com a individualização (dano/cuidado e justiça/reciprocidade) e outro à coesão de grupo (pertencimento/lealdade; autoridade/respeito; pureza/santidade) (Graham et al., 2009). A tendência individualizante possui como ênfase os direitos e bem-estar dos indivíduos, enquanto a tendência coesiva defende valores como autocontrole, dever, obediência, respeito, lealdade (Graham et al., 2009). Essa categorização, já utilizada em outros estudos, demonstra uma consistência na literatura (Franks e Scherr, 2015; Galli e Modesto, 2023; Glória-Filho e Modesto, 2019; Graham et al., 2020; Modesto et al., 2020). Amanda Graham et al. (2009) pioneiramente propuseram essa organização, e desde então, diversos pesquisadores adotaram e ampliaram essa abordagem (Barnett e Hilz, 2018, Day et al., 2014).
O entendimento da moralidade enquanto multidimensional tem favorecido a compreensão de diferentes fenômenos como a relação entre valores morais e a desconfiança nas vacinas (Amin et al., 2017; Heine e Wolters, 2021; Schmidtke et al., 2022), saúde pública (Graham et al., 2020; Modesto et al., 2020), atitudes frente ao estupro (Barnett e Hilz, 2018; Milesi et al., 2020), atitudes punitivas (Silver e Silver, 2017; Vaughan et al., 2019), além de divergências no âmbito político. Sobre este aspecto, há evidência que indivíduos liberais tendem a ter uma matriz moral baseada nos fundamentos de cuidado e justiça. Já os conversadores possuem uma matriz moral que inclui os cinco fundamentos, priorizando, no entanto, pertencimento, autoridade e pureza, quando comparado com os liberais (Graham et al., 2009). Alguns estudos têm identificado resultados semelhantes em contextos culturais diferentes (Glória-Filho e Modesto, 2019; Harper e Hogue, 2019; Milesi, 2017; Nilsson e Erlandsson, 2015; Zacarias et al., 2023) indicando o potencial da TFM para a compreensão das orientações políticas.
Apesar deste potencial, é relevante a condução de investigações em contextos que escapem ao continuum liberal\conservador (Republicanos e Democratas) dos Estados Unidos e direita/esquerda da Europa (Yılmaz et al., 2016). Nos Estados Unidos, o sistema político é caracterizado por dois grandes partidos dominantes, o Partido Democrata e o Partido Republicano, que historicamente têm representado as principais correntes políticas do país, com uma divisão mais clara entre liberais e conservadores. Por outro lado, o Brasil possui um sistema partidário mais fragmentado, com uma multiplicidade de partidos políticos que representam uma variedade de ideologias e interesses (Maciel et al., 2018). Além disso, a identificação ideológica dos partidos no Brasil pode ser menos clara para os eleitores, como evidenciado pelo fato de que apenas metade dos participantes do estudo sabiam quais partidos eram considerados de “esquerda” ou de “direita” (Carreirão, 2007), termos usados no país quando se fala em polarização política. Demonstra-se, assim, uma falta de conhecimento político por trás das opiniões eleitorais do brasileiro. No entanto, a literatura indica que alguns partidos, como PSOL, PT, PCdoB, PDT, PPS e PV, tendem a posicionar-se mais à esquerda, enquanto PSDB, PMDB, DEM, PP, PSD e SD têm inclinação mais à direita (Scheeffer, 2016). Outro estudo (Alarcon, 2018) reforça essa tendência, destacando a coerência ideológica em relação ao papel do Estado, com alguns partidos inclinados à esquerda (PSOL, PT, PCdoB, PSB, PDT) e outros à direita (PSC, PRB, PTB, PR, PP, DEM).
Mesmo com essa falta de clareza, a TFM se mostrou robusta como preditora de orientações políticas no Brasil. Em estudos desenvolvidos no país (Franco e Pound, 2022; Glória-Filho e Modesto, 2019), foram encontradas evidências que corroboram as tendências indicadas pela TFM. Pessoas com inclinações de esquerda apresentaram maiores índices dos fundamentos morais que compõem a tendência individualizante, enquanto pessoas com inclinações de direita apresentaram maiores índices dos fundamentos da tendência coesiva.
Há evidências que essas diferenças na matriz moral entre liberais e conservadores podem favorecer também a compreensão da intenção de votos. Em 2008, nos Estados Unidos, verificou-se uma relação entre os fundamentos morais e a escolha do candidato nas eleições presidenciais do partido democrata (Iyer et al., 2010). Em um estudo posterior realizado nas eleições presidenciais de 2012 e 2016 dos Estados Unidos (Franks e Scherr, 2015; Weinschenk e Dawes, 2019), foi examinada a relação entre os fundamentos morais e a escolha do candidato. Verificou-se, conforme hipotetizado, que as tendências individualizante e coesiva são fortes preditores da intenção de votos para candidatos liberais e conservadores, respectivamente (Milesi, 2015, 2017; Weinschenk e Dawes, 2019).
Tendo em vista o potencial da TFM para a compreensão de uma série de fenômenos do âmbito político (Clifford, 2016; Day et al., 2014; Franks e Scherr, 2015; Galli e Modesto, 2023; Johnson et al., 2014; Milesi, 2015, 2017; Rempala et al., 2016; Silver e Silver, 2017), somado ao contexto de polarização política brasileira (Giacomozzi et al., 2022), foram desenvolvidos quatro estudos que, conforme mencionado, tiveram como objetivo analisar a influência dos fundamentos morais na intenção de votos a candidatos para presidência nas eleições brasileiras de 2018 e 2022.
As eleições presidenciais no Brasil ocorrem por meio do sistema majoritário, em que vence o candidato que obtiver a maioria dos votos, isto é, metade dos votos mais um, desconsiderando os votos brancos e nulos. Considerando que o Brasil segue um sistema pluripartidário, a eleição ocorre em dois turnos. O primeiro é disputado pela totalidade dos candidatos e o segundo pelos candidatos que conseguiram uma proporção maior de votos no primeiro turno, desde que o que obteve mais votos não tenha alcançado a maioria absoluta (Tribunal Superior Eleitoral [TSE], 2019). Os Estudos 1 e 2 avaliaram, respectivamente, a influência dos fundamentos morais na intenção de votos no 1º e 2º turno das eleições presidenciais de 2018, enquanto os Estudos 3 e 4 nas eleições de 2022. Formulou-se como hipótese (H1) que maiores índices da tendência individualizante iriam predizer preferências para candidatos de esquerda. Adicionalmente (H2) acredita-se que a tendência coesiva iria predizer a intenção de votos para candidatos de direita.
Participaram desta pesquisa 142 pessoas (50,7% do sexo masculino). As idades variaram entre 18 e 63 anos (M = 26,97; DP = 10,84). A maioria se declarou heterossexual (72,7%), solteiro (74,6%), branco (55,6%) e com ensino superior incompleto (61,3%). Em relação à religiosidade, prevaleceram participantes cristãos (44,2%) e ateus (26,1%). A renda familiar variou de “menos que 1 salário mínimo” a “acima de 7 salários mínimos” com uma maior prevalência de rendas acima de 7 salários mínimos (47,9%), em que 1 salário mínimo na época era equivalente a 172,54 € (R$ 954,00).
Para a realização do primeiro estudo, foi utilizado o Questionário de Fundamentos Morais (QFM) (Graham et al., 2009) adaptado para o contexto brasileiro (Silvino et al., 2016). A versão adaptada do QFM consiste em duas seções com 13 itens na primeira seção e 14 na segunda, totalizando 27 itens. Na primeira seção, os participantes avaliam cada item em relação à sua relevância para determinar se algo é correto ou errado (por exemplo, “Se alguém sofreu ou não emocionalmente”, fundamento de dano/cuidado). A escala varia de 0 (não é nada relevante) até 5 (extremamente relevante). Na segunda seção são apresentadas afirmativas sobre as quais a pessoa julga o quanto concorda com cada uma delas (por exemplo, “Eu tenho orgulho da história do meu país”, fundamento de pertencimento). A escala varia de 0 (discordo fortemente) até 5 (concordo fortemente).
O QFM apresenta uma escala para cada uma dos cinco fundamentos morais: dano/cuidado (por exemplo, “Compaixão por aqueles que estão sofrendo é a virtude mais importante.”), justiça/reciprocidade (por exemplo, “Quando o governo cria leis, o princípio fundamental deve ser garantir que todos sejam tratados de forma justa.”), pertencimento/lealdade (por exemplo, “As pessoas deveriam ser leais a seus familiares, mesmo que tenham feito algo errado.”), autoridade/respeito (por exemplo, “Respeito por autoridade é algo que todas as crianças precisam aprender.”), e pureza/santidade (por exemplo, “A castidade é uma virtude importante e valiosa.”). Escores mais altos indicam um maior nível de ênfase naquele fundamento moral. Neste estudo, os cinco fundamentos morais compuseram dois fatores: Tendência Individualizante (fundamentos de Justiça e Cuidado) com um alfa de Cronbach de 0,78 e Tendência Coesiva (fundamentos Pertencimento, Autoridade e Pureza) com um alfa de Cronbach de 0,87.
A intenção de votos para os 13 candidatos a presidente foi medida por meio de uma afirmativa com múltiplas escolhas “indique qual dos presidenciáveis tem a maior probabilidade de receber o seu voto” e, abaixo do item, era apresentada a foto dos 13 candidatos, seus nomes e a sigla de seus partidos. O nome dos políticos apareceu em ordem alfabética. Os participantes também tinham a opção de responder: Não Sei, Branco e Nulo. O participante só poderia indicar a intenção de votar em apenas um candidato.
Em seguida, era mostrado novamente a foto, o nome e as siglas dos candidatos à presidência, com o objetivo de verificar qual o posicionamento político que os participantes atribuíam para cada candidato. A escala variou de 1 até 5 (1 = Direita, 2 = Centro-direita, 3 = Centro, 4 = Centro-esquerda e 5 = Esquerda).
O questionário foi divulgado online por meio das redes sociais e e-mails. Os participantes responderam primeiramente o questionário de fundamentos morais, depois a sua intenção de voto, em seguida atribuíram um posicionamento político para os candidatos e por último informavam dados sociodemográficos. A divulgação do questionário ocorreu do período de 12/09/2018 (oficialização de todas as candidaturas) até 06/10/2018 (véspera das eleições em 1º turno).
Primeiramente, com o objetivo de determinar qual posicionamento político os participantes atribuíram aos candidatos à presidência (Direita, Centro-direita, Centro, Centro-esquerda ou Esquerda), analisou-se a frequência esperada e os resíduos para cada posicionamento político atribuído, conforme visualizado na Tabela 1.
Tabela 1 Frequência observada do posicionamento político e resíduos eleições 2018
Candidato |
Esquerda |
Centro - Esquerda |
Centro |
Centro - Direita |
Direita |
|
Ciro Gomes |
N observado |
33 |
64 |
37 |
3 |
5 |
Resíduo |
4,6 |
35,6 |
8,6 |
-25,4 |
-23,4 |
|
Fernando Haddad |
N observado |
83 |
49 |
5 |
1 |
4 |
Resíduo |
54,6 |
20,6 |
-23,4 |
-27,4 |
124,4 |
|
Geraldo Alckmin |
N observado |
9 |
8 |
41 |
53 |
31 |
Resíduo |
-19,4 |
-20,4 |
12,6 |
24,6 |
2,6 |
|
Guilherme Boulos |
N observado |
104 |
19 |
12 |
2 |
5 |
Resíduo |
75,6 |
-9,4 |
-16,4 |
-26,4 |
-23,4 |
|
Henrique Meirelles |
N observado |
9 |
6 |
38 |
47 |
42 |
Resíduo |
-19,4 |
-22,4 |
9,6 |
18,6 |
13,6 |
|
Jair Bolsonaro |
N observado |
4 |
1 |
8 |
19 |
110 |
Resíduo |
-24,4 |
-27,4 |
-20,4 |
-9,4 |
81,6 |
|
João Amoedo |
N observado |
7 |
2 |
36 |
42 |
55 |
Resíduo |
-21,4 |
-26,4 |
7,6 |
13,6 |
26,6 |
|
Marina Silva |
N observado |
28 |
37 |
64 |
10 |
3 |
Resíduo |
-0,4 |
8,6 |
35,6 |
-18,4 |
-25,4 |
Nota. Não foram considerados candidatos que não receberam intenção de votos. Frequência esperada = 28,40
A partir dos dados apresentados na Tabela 1, verificou-se que os candidatos Ciro Gomes, Fernando Haddad e Guilherme Boulos foram mais associados a posicionamentos políticos de esquerda (i.e. maiores resíduos para a posição de esquerda ou centro-esquerda), enquanto os candidatos Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Jair Bolsonaro e João Amoêdo foram associados a posicionamentos políticos de direita (i.e. maiores resíduos para a posição de direita ou centro-direita). A candidata Marina Silva foi indicada como candidata de centro (i.e. maior resíduo para a posição de centro). A partir desses achados, foi criada uma variável binária que compôs o espectro político de Direita e Esquerda, sendo a intenção de votos para Marina excluída das análises. Foi observado a seguinte distribuição da intenção de votos: Ciro Gomes recebeu 33 votos (23,2%), Fernando Haddad contabilizou 18 votos (12,7%), Geraldo Alckmin teve 1 voto (0,704%), Guilherme Boulos (3,52%) e Henrique Meirelles (3,52%) receberam 5 votos, Jair Bolsonaro recebeu 34 votos (23,9%), João Amoêdo teve 19 votos (13,4%), Marina Silva contabilizou 9 votos (6,34%) e 18 (12,674%) votos foram registrados como Branco, Nulo ou Não sei.
Em seguida, foi realizada uma análise de regressão logística, a fim de testar a influência dos fundamentos morais e de variáveis sociodemográficas na intenção de votos. Todas as variáveis inseridas no modelo foram padronizadas em escores Z. Os dados encontrados indicaram que as variáveis de tendência individualizante e coesiva apresentaram uma significativa capacidade de predição da intenção de voto, como apresentado na Tabela 2.
Tabela 2 Resultados da regressão logística entre a tendência individualizante como coesiva e o posicionamento político Direita-Esquerda do 1º turno das eleições de 2018
Variável |
B |
Sig. |
Individualizante |
1,04 |
< 0,001 |
Coesiva |
-1,89 |
< 0,001 |
Renda |
- 0,12 |
0,637 |
Escolaridade |
0,39 |
0,271 |
Idade |
-0,55 |
0,209 |
Nagelkerke R² = 0,57
Nota. Direita foi codificada como 0 e Esquerda foi codificada como 1.
Conforme pode ser visualizado na Tabela 2, verificou-se que maiores índices da tendência individualizante favorecem uma maior intenção de votos em candidatos de esquerda, enquanto maiores índices de tendência coesiva reduzem a intenção de votos para estes candidatos. Nenhuma das variáveis sociodemográficas testadas no modelo de regressão apresentaram resultados significativos. De maneira geral, portanto, conforme postulado pela TFM (Graham et al., 2009) as hipóteses foram corroboradas.
Com o objetivo de incrementar as evidências encontradas do Estudo 1, em que os fundamentos morais demonstraram ter influência na intenção de votos, no Estudo 2 foi analisada a influência da tendência individualizante e coesiva na intenção de votos do segundo turno das eleições presidenciais brasileiras de 2018, em que o candidato Fernando Haddad emergiu como representante da esquerda e Jair Bolsonaro da direita.
Participaram desta pesquisa 168 pessoas (64,3% sexo feminino). As idades variaram entre 18 e 64 anos de idade (M = 31,45; DP = 13,44). A amostra foi composta majoritariamente por participantes que se declaram heterossexuais (75,6%), solteiros (65,5%), com ensino superior incompleto (51,2%), cristãos (48,5%) e brancos (59,5%). A renda familiar variou de “menos que 1 salário mínimo” a “acima de 7 salários mínimos” com uma maior prevalência de rendas acima de 7 salários mínimos (39,3%), em que 1 salário mínimo na época era equivalente a 172,54 € (R$ 954,00).
Foram utilizados, assim como no Estudo 1, o QFM, uma medida de intenção de votos e um questionário sociodemográfico. Sobre o QFM, a Tendência Individualizante apresentou um alfa de Cronbach de 0,85 e Tendência Coesiva com um alfa de Cronbach de 0,87.
A intenção de votos foi medida por meio de uma questão dicotômica (indique qual dos presidenciáveis tem a maior probabilidade de receber o seu voto) e abaixo do item foram apresentadas as fotos dos 2 candidatos à presidência no 2º turno e a sigla de seus partidos.
A coleta de dados ocorreu online sendo a divulgação feita de maneira semelhante ao Estudo 1. Os participantes responderam primeiramente o QFM, em seguida ao item de intenção de voto e por último informavam dados sociodemográficos. A divulgação da pesquisa ocorreu depois da publicação oficial dos resultados do primeiro turno. O questionário para a coleta ficou disponível de 09/10/2018 até 27/10/2018 (véspera da votação em 2º turno).
Sobre a intenção de voto indicada no Estudo 2, Bolsonaro recebeu 51 votos (30,4%), Haddad obteve 83 votos (49,4%), e 34 votos (20,24%) foram registrados como Branco, Nulo ou Não sei. Assim como realizado no Estudo 1, foi conduzida regressão logística com o objetivo de testar a influência dos fundamentos morais e de dados sociodemográficos na intenção de votos, como apresentado na Tabela 3. Os votos nulos e branco foram desconsiderados nas análises. Assim como no Estudo 1, foram usados os escores padronizados.
Tabela 3. Resultados da regressão logística entre a tendência individualizante como coesiva e o posicionamento político Jair Bolsonaro x Fernando Haddad
Variável |
B |
Sig. |
Individualizante |
2,11 |
< 0,001 |
Coesiva |
-2,89 |
< 0,001 |
Renda |
- 0,23 |
0,430 |
Escolaridade |
0,27 |
0,365 |
Idade |
0,06 |
0,857 |
Nagelkerke R² = 0,69
Nota. Jair Bolsonaro (direita) foi codificado como 0 e Fernando Haddad (esquerda) foi codificado como 1.
Conforme pode se visualizar na Tabela 3, verificou-se que maiores índices da tendência individualizante favorecem uma maior intenção de voto para candidatos de esquerda, enquanto maiores índices de tendência coesiva fazem com que seja menos provável que o indivíduo vote em candidatos de esquerda. Nenhuma das variáveis demográficas inseridas no modelo de regressão apresentaram resultados significativos. Ou seja, novamente as hipóteses foram corroboradas.
Com o objetivo de analisar se os efeitos da TFM se mantiveram robustos ao longo do tempo e em eleições distintas, no Estudo 3 foi analisada a influência da tendência individualizante e coesiva na intenção de votos do primeiro turno das eleições presidenciais brasileiras em 2022.
Participaram desse estudo 104 pessoas (54,8% sexo feminino). As idades variaram entre 18 e 81 anos de idade (M = 38,8; DP = 14,5). A amostra foi composta majoritariamente por participantes que se declaram casados (47,1%), com pós-graduação (51,2%), e que residiam no Distrito Federal (71,8%). A renda familiar variou de “menos que 1 salário mínimo” a “acima de 7 salários mínimos” com uma maior prevalência de rendas acima de 7 salários mínimos (43,3.3%), em que 1 salário mínimo na época era equivalente a 219,20 € (R$ 1.212,00).
Foram utilizados, assim como no Estudo 1, o Questionário de Fundamentos Morais, uma medida de intenção de votos, a indicação da vinculação política dos candidatos e um questionário sociodemográfico. Sobre o QFM, a Tendência Individualizante apresentou um alfa de Cronbach de 0,84 e Tendência Coesiva com um alfa de Cronbach de 0,91.
O questionário foi divulgado online por meio das redes sociais e e-mails. Os participantes responderam primeiramente o questionário de fundamentos morais, depois a sua intenção de voto, em seguida atribuíram um posicionamento político para os candidatos e por último informaram os dados sociodemográficos. A divulgação do questionário ocorreu do período de 22/08/2022 até 12/09/2022.
Primeiramente, com o objetivo de determinar qual posicionamento político os participantes atribuíram aos candidatos à presidência (Esquerda, Centro-esquerda, Centro, Centro-direita ou Direita), analisou-se a frequência esperada e os resíduos para cada posicionamento político atribuído, conforme visualizado na Tabela 4.
Tabela 4 Frequência observada do posicionamento político e resíduos das eleições de 2022
Candidato |
Esquerda |
Centro - Esquerda |
Centro |
Centro - Direita |
Direita |
|
Ciro Gomes |
N observado |
12 |
45 |
32 |
13 |
2 |
Resíduo |
-8,8 |
24,2 |
11,2 |
-7,8 |
-18,8 |
|
Jair Bolsonaro |
N observado |
3 |
3 |
11 |
17 |
70 |
Resíduo |
-17,8 |
-17,8 |
-9,8 |
-3,8 |
49,2 |
|
Lula |
N observado |
49 |
44 |
10 |
0 |
1 |
Resíduo |
28,2 |
23,2 |
-10,8 |
-20,8 |
-19,8 |
|
Pablo Marçal |
N observado |
12 |
10 |
48 |
22 |
12 |
Resíduo |
-8,8 |
-10,8 |
27,2 |
1,2 |
-8,8 |
|
Simone Tebet |
N observado |
6 |
18 |
48 |
28 |
4 |
Resíduo |
-14,8 |
-2,8 |
27,2 |
-0,8 |
-16,8 |
Nota. Não foram considerados candidatos que não receberam intenção de votos. Frequência esperada de 20,8
A partir dos dados apresentados na Tabela 4, verificou-se que os candidatos Ciro Gomes e Lula foram mais associados a posicionamentos políticos de esquerda (i.e. maiores resíduos para a posição de esquerda ou centro-esquerda), enquanto o candidato Jair Bolsonaro foi associado à direita (i.e. maiores resíduos para a posição de direita ou centro-direita). Porém, os candidatos Pablo Marçal e Simone Tebet foram associados a posicionamentos políticos de centro, sendo excluídos das análises finais. Outro fato importante é que Pablo Marçal teve sua candidatura negada pelo Tribunal Superior Eleitoral, no dia 06/09/2022. A partir desses achados, foi criada uma variável binária que compôs o espectro político de Direita e Esquerda. Foi observado a seguinte distribuição da intenção de votos: Ciro Gomes recebeu 5 votos (4,81%), Jair Bolsonaro recebeu 22 votos (21,2%), Lula contabilizou 38 votos (36,5%), Pablo Marçal teve 3 votos (2,88%), Simone Tebet obteve 4 votos (3,85%) e 32 (30,7%) votos foram registrados como Branco, Nulo ou Não sei.
Em seguida, foi realizada uma análise de regressão logística, a fim de testar a influência dos fundamentos morais e de variáveis sociodemográficas na intenção de votos. Os dados encontrados indicaram que as variáveis de tendência individualizante e coesiva apresentaram uma significativa capacidade de predição da intenção de voto, como apresentado na Tabela 5.
Tabela 5. Resultados da regressão logística entre a tendência individualizante como coesiva e o posicionamento político Direita-Esquerda do 1º turno das eleições de 2022
Variável |
B |
Sig. |
Individualizante |
1,50 |
0,005 |
Coesiva |
- 3,34 |
< 0,001 |
Renda |
0,39 |
0,526 |
Escolaridade |
0,15 |
0,832 |
Idade |
-0,71 |
0,344 |
Nagelkerke R² = 0,73
Nota. Direita foi codificada como 0 e Esquerda foi codificada como 1.
Conforme pode ser visualizado na Tabela 5, verificou-se que maiores índices da tendência individualizante favorecem uma maior intenção de votos em candidatos de esquerda, enquanto maiores índices de tendência coesiva reduzem a intenção de votos para estes candidatos. Nenhuma das variáveis sociodemográficas testadas no modelo de regressão apresentaram resultados significativos, corroborando novamente as hipóteses.
Com o objetivo de incrementar as evidências encontradas nos estudos anteriores, em que os fundamentos morais demonstraram ter influência na intenção de votos, analisou-se o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras de 2022, em que o candidato Luís Inácio ‘Lula’ da Silva emergiu como representante da esquerda e Jair Bolsonaro da direita.
Participaram desta pesquisa 102 pessoas (78,4% sexo feminino). As idades variaram entre 18 e 78 anos de idade (M = 48,0; DP = 15,7). A amostra foi composta majoritariamente por participantes casados (44,1%), com pós-graduação (39,2%), e brancos (68,6%). A renda familiar variou de “menos que 1 salário mínimo” a “acima de 7 salários mínimos” com uma maior prevalência de rendas entre 1 e 3 salários mínimos (30,4%), em que 1 salário mínimo na época era equivalente a 219,20 € (R$ 1.212,00).
Foram utilizados, o QFM, uma medida de intenção de votos e um questionário sociodemográfico. Sobre o QFM, a Tendência Individualizante apresentou um alfa de Cronbach de 0,74 e Tendência Coesiva com um alfa de Cronbach de 0,87.
A intenção de votos foi medida por meio de uma questão dicotômica (indique qual dos presidenciáveis tem a maior probabilidade de receber o seu voto) e abaixo do item foram apresentadas as fotos dos 2 candidatos à presidência no 2º turno e a sigla de seus partidos.
A coleta de dados ocorreu online, sendo a divulgação feita de maneira semelhante ao Estudo 2. Os participantes responderam primeiramente o QFM, em seguida ao item de intenção de voto e por último informavam dados sociodemográficos. O questionário para a coleta ficou disponível de 17/10/2022 até 30/10/2022 (dia da votação do 2º turno).
Sobre a intenção de voto indicada no Estudo 4, Bolsonaro recebeu 15 votos (14,7%), Lula obteve 83 votos (81,4%), e 4 votos (3,92%) foram registrados como Branco, Nulo ou Não sei. Assim como realizado no Estudo 3, foi conduzida regressão logística com o objetivo de testar a influência dos fundamentos morais e de dados sociodemográficos na intenção de votos, como apresentado na Tabela 6. Os votos nulos e branco foram desconsiderados nas análises.
Tabela 6 Resultados da regressão logística entre a tendência individualizante como coesiva e o posicionamento político Jair Bolsonaro x Lula
Variável |
B |
Sig. |
Individualizante |
1,22 |
0,006 |
Coesiva |
-2,08 |
0,003 |
Renda |
-0,13 |
0,766 |
Escolaridade |
0,45 |
0,242 |
Idade |
0,02 |
0,960 |
Nagelkerke R² = 0,52
Nota. Jair Bolsonaro (direita) foi codificado como 0 e Lula (esquerda) foi codificado como 1.
Conforme pode se visualizar na Tabela 6, verificou-se que maiores índices da tendência individualizante favorecem uma maior intenção de voto para candidatos de esquerda, enquanto maiores índices de tendência coesiva fazem com que seja menos provável que o indivíduo vote em candidatos de esquerda. Nenhuma das variáveis demográficas inseridas no modelo de regressão apresentaram resultados significativos.
A presente pesquisa, conforme mencionado, buscou investigar o período eleitoral brasileiro, com base na Teoria dos Fundamentos Morais (Graham et al., 2009; Haidt e Joseph, 2004), tendo como objetivo analisar a influência dos fundamentos morais na intenção de votos a candidatos para presidência nas eleições brasileiras de 2018 e de 2022. Os Estudos apresentaram evidências do potencial preditivo da TFM para compreensão da intenção de voto em candidatos de direita e esquerda no país.
Em todos os estudos, verificou-se que fundamentos de Dano e Justiça, que compõem a tendência individualizante, preveem votos de apoio para candidatos de Esquerda. Tal achado é consistente com as políticas da esquerda brasileira que, em geral, valorizam a igualdade dos indivíduos acima de outras questões políticas. Por outro lado, maiores índices dos fundamentos de Pertencimento, Autoridade e Pureza, que compõem a tendência coesiva, preveem votos de suporte para candidatos de Direita, os quais, no Brasil, costumam ter uma visão mais protetiva e tradicional, com pouca abertura para mudanças sociais.
Tais achados evidenciam que, a despeito de particularidades contextuais do país, posições políticas progressistas e conservadoras são orientadas por fundamentos morais diferentes (Graham et al., 2009; Gloria-Filho e Modesto, 2019; Haidt, 2007; Haidt e Graham, 2007) como também que fundamentos morais demonstram uma significativa capacidade de predição de votos (Franks e Scherr, 2015; Iyer et al., 2010).
A presente pesquisa foi limitada pelo uso de amostras de conveniência e não representativas. Embora os resultados obtidos sejam bastante consistentes em todos os estudos, essa ressalva deve ser considerada e estudos futuros podem lançar mão de amostras maiores e representativas. Apesar de apontarmos tal limitação, vale mencionar que estudos recentes têm encontrado efeitos semelhantes quando comparadas amostras representativas e de conveniência (Coppock et al., 2018), o que realça a relevância dos achados dos quatro estudos aqui apresentados.
Outro aspecto que vale ser mencionado é que a presente pesquisa investigou a intenção de voto e não o comportamento real de voto. Nesse sentido, acreditamos que estudos futuros devem investigar a associação entre o endosso moral e o comportamento de voto por meio de medidas retrospectivas, por exemplo.
Acreditamos que, apesar das limitações, o estudo possui algumas contribuições. Identificamos a importância da TFM como preditor da intenção de votos em 4 estudos independentes, realizados com uma distância temporal de 4 anos e em todos os estudos as hipóteses foram corroboradas. Nesse sentido, evidenciamos que a moralidade desempenha um papel fundamental em decisões políticas, conforme previsto pela teoria. Esses achados em um contexto político com diversas peculiaridades e distinções do norte global realça a importância da teoria, sobretudo em um momento que se tem discutido que muitos efeitos psicológicos não são identificados em diferentes contextos culturais (Pettigrew, 2018).
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DANIEL OLIVEIRA ZACARIAS
Doutorando em Psicologia Social pela Universidade de Brasília (UnB) e membro do Instituto de Ciência Neurociência Social e Afetiva (INCT-SANI).
danieloli.zac@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-0632-9352
RIZZIA DAPHNE ANDRADE ALMEIDA
Graduanda em Psicologia pelo Centro Universitário de Brasília (CEUB).
rizzia.daphne@sempreceub.com
https://orcid.org/0009-0008-1157-2481
JOÃO GABRIEL MODESTO
Doutor em Psicologia Social pela Universidade de Brasília. Professor do Programa de Pós-Graduação em Gestão, Educação e Tecnologias da Universidade Estadual de Goiás.
joao.modesto@ueg.br
https://orcid.org/0000-0001-8957-7233
FORMATO DE CITACIÓN
Zacarias, Daniel O.; Almeida, Rizzia D. A. & Modesto, João G. (2024). A Teoria dos Fundamentos Morais e as eleições presidenciais brasileiras em 2018 e 2022. Qua-derns de Psicologia, 26(1), e1995. https://doi.org/10.5565/rev/qpsicologia.1995
HISTORIA EDITORIAL
Recibido: 18-01-2023
1ª revisión: 29-01-2024
Aceptado: 03-02-2024
Publicado: 03-04-2024